11/06/2010

Entrevista do Continente à Presidente da APC

No âmbito da parceria entre o Continente e a APC, e no decorrer da Feira da Área Viva, foi efectuada a seguinte entrevista, disponível online.
Entrevista com Dr.ª Raquel Madureira – Presidente da Associação Portuguesa de Celíacos


A Doença Celíaca é uma doença auto-imune com múltiplas manifestações e correlaciona-se com outras patologias, tais como a desnutrição, anemia, depressão, osteoporose, cancro, etc. O seu diagnóstico precoce é extremamente importante para prevenir o desenvolvimento das mesmas.

1. Como está diagnosticada a doença celíaca em Portugal?
Resposta: Não há dados exactos sobre a Doença Celíaca em Portugal, uma vez que o seu diagnóstico está muitíssimo subavaliado no nosso país. Há a falsa ideia de que os valores não vão para além dos 8 mil celíacos, em vez de 100.000, número extrapolado muito provável, face às comparações com índices de outros países, e reforçado pela ausência, até ao momento, de estudo epidemiológico nacional.

2. Considera que os profissionais de saúde estão sensíveis para esta patologia?
Resposta: Não. Infelizmente, não! Os profissionais de saúde continuam a pensar que esta é uma doença de crianças e esquecem-se da variedade de sintomas que podem ocorrer já na fase de adulto. Para além disso, eles não se actualizam nas novas ferramentas de diagnóstico e, portanto, não recorrem aos meios mais específicos e sensíveis, já disponíveis. Os poucos que conseguem acertar no diagnóstico, frequentemente, não acompanham o doente da forma mais conveniente e, muitas vezes, cometem erros grosseiros na definição da doença. É recorrente o doente recém-diagnosticado ser mandado para casa e, por via disso, fica sem garantias que vai ser bem acompanhado por uma dietista ou nutricionista.

3. Em termos gerais, considera que os celíacos cumprem rigorosamente a dieta sem glúten?
Resposta: Existe uma pequena percentagem de doentes que não cumpre a dieta por mera opção pessoal, mas existe uma outra, em maior número, que não o faz por desconhecer as consequências desse incumprimento. Há ainda pessoas – e isso é mais pungente - que não cumprem a dieta por razões puramente de carência económica, e outras há que, por não terem quaisquer sintomas, julgam que não estão a agredir o organismo. Penso que estas elevadas percentagens resultam da ausência de desenvolvimento duma proveitosa relação médico-doente, pois acredito que os celíacos, se souberem que o incumprimento das regras certas os leva a ter um risco muito elevado de desenvolvimento de Doença Refractária e risco aumentado de neoplasias, para além de perda de qualidade de vida, não assumiriam essa postura de forma deliberada. Para além destas pessoas, existem ainda os que se esforçam por cumprir a dieta, mas não o conseguem pelo facto da nossa sociedade não estar ainda ciente e sensibilizada para esta situação e, portanto, ser muito difícil eles comprarem alimentos seguros e comerem fora de casa. Está já provado que a dificuldade suprema é precisamente nos locais de trabalho e nas escolas.

4. A nova legislação relativa à composição e rotulagem dos produtos sem glúten trouxe, com certeza, uma maior segurança aos celíacos. Considera que ainda há muito mais que se pode fazer?
Resposta: Esta nova rotulagem, a ser cumprida, revela que estamos no bom caminho, mas ela não acabará com os problemas, pois os alimentos não específicos continuam a ser um grave handicap, para além do preço muito elevado dos produtos especificamente sem glúten. Óbvio que o caminho a percorrer ainda é longo, pois o ideal era que todas as empresas introduzissem, junto com as análises ordinárias de um produto, uma outra, específica, ao teor de glúten contido. Esse procedimento não ficará dispendioso e não irá encarecer significativamente o produto final. Julgo que isso não está ainda em marcha simplesmente porque as empresas não estão sensibilizadas para este problema e, claro, por não ser ainda obrigatório em termos de legislação.

5. Gostaria de deixar uma mensagem à população em geral? E aos celíacos?
Resposta: Gostaria que a população em geral estivesse mais atenta e responsável pela sua saúde, alertando os médicos se não se sentirem saudáveis, pois muitas vezes os sintomas são muito diversos, podendo apenas ser tão leves como simples ligeiras alterações de humor ou, então, serem tão graves como problemas de infertilidade e abortos recorrentes. Apelo aos celíacos que se esforcem por cumprir uma dieta sem glúten pois o incumprimento pode, apesar de ausência de sintomas, ter consequências muito graves, como, por exemplo, o desenvolvimento de linfoma. Caso, após o diagnóstico, não se sintam suficientemente esclarecidos, procurem a Associação, porque o apoio e informação é fulcral para que possam voltar a sentir-se saudáveis.Gostaria também de acrescentar que, na hipótese de dificuldades económicas para a compra de produtos específicos sem glúten, procurem comer produtos alternativos mais saudáveis, tais como leguminosas, frutas e legumes, deixando os mais dispendiosos para dias de festa. Sei que, muitas vezes, não é uma doença fácil de enfrentar no quotidiano, mas tem que ser assumido que é essa a condição instalada para a qual não se tem alternativa. A vida sem glúten é possível e é necessária para que possam ser saudáveis e terem uma boa qualidade de vida.

2 comentários:

Anónimo disse...

Gostei muito da entrevista e é bem verdade eu sou um caso de uma pessoa diagnosticada ja em adulta e possivelmente com sintomas desda infancia...
Durante anos diziam tinha um problema no pancreas por sorte encontrei um medico que me diagnosticou Dc os sintomas eram mais que evidentes e agravavam-se..No entanto nao consigo encontrar quem me esclareça ou acompanhamento mais apropriado para a doença...
tenho conseguido algum apoio com Alexandra Gameiro...
ha alturas em que estou mesmo perdi ja voltei ficar doente sem saber porquê.Cumpro a dieta mas financeiramente é muito mais dificil mas tenho consciencia do risco que corro se nao o fizer e fico mesmo mal se nao o fizer..

Vanessa disse...

Caro anónimo/a,

Tenho a certeza de que se entrar em contacto com a APC, encontrará apoio e esclarecimento para as dúvidas que possa ter em relação à DC.